O naufrágio do Santíssimo Sacramento, um galeão português que afundou nas águas da Baía de Todos-os-Santos em 1668, continua fascinando historiadores e mergulhadores. O biólogo e mergulhador Robson Oliveira, um dos especialistas no assunto, contou em entrevista ao Guia BTS sobre suas experiências com este impressionante naufrágio, e revelou detalhes históricos e suas próprias vivências submersas.
Construído em 1650, o Sacramento era a capitânia da armada portuguesa, ostentando 60 canhões e 824 homens. A embarcação foi fundamental na defesa da costa de Portugal contra os piratas. Quando zarpou de Lisboa em fevereiro de 1668, seu destino era a então colônia do Brasil, trazendo a bordo o general Francisco Correia da Silva e sua comitiva para a capitania da Bahia.
Croqui realizado com base nos trabalhos da Marinha do Brasil em 1977
Robson destaca o momento crucial da tragédia: “Foi quando ele bateu no Banco de Santo Antônio, que é um banco bem conhecido aqui em Salvador,” lembra. Na noite de 5 de maio de 1668, com ventos fortes do sul, o Sacramento colidiu com um banco de areia submerso, e a embarcação sucumbiu após horas à deriva. “O navio disparou seus canhões em sinal de socorro, mas o mau tempo atrasou o resgate até o amanhecer, quando já era tarde demais.”
Dos cerca de 600 tripulantes e passageiros, apenas 70 sobreviveram, incluindo pescadores que ajudaram nos resgates. O corpo do general Correia da Silva, assim como o de muitos outros, foi encontrado nas praias no dia seguinte. “A história do naufrágio é carregada de lendas e mistérios, principalmente porque ele transportava muitos bens valiosos e peças de artilharia que foram desviadas ao longo dos anos”, comenta Robson.
Em 1973, mergulhadores amadores redescobriram os destroços, dando início a uma série de pesquisas arqueológicas coordenadas pela Marinha do Brasil. “O sítio arqueológico é protegido por lei hoje, mas isso não impediu que algumas peças fossem retiradas ilegalmente no passado”, explica Robson, referindo-se ao caso de canhões recuperados em Recife. A operação arqueológica, liderada por Ulysses Pernambucano de Mello, revelou uma impressionante coleção de artefatos históricos, que hoje podem ser vistos em museus de Salvador.
“O mergulho no naufrágio do Sacramento é uma experiência única. É um dos mais profundos, a cerca de 30 metros, então não é para qualquer mergulhador. Mas para quem tem a qualificação, é incrível observar os canhões, âncoras e até fragmentos de louça portuguesa ainda no fundo do mar”, afirma o mergulhador.
Além da imponência histórica, Robson ressalta o impacto do tempo e da natureza sobre os destroços. “Cada vez que mergulho lá, é como ver um novo pedaço da história. Os corais e outras formas de vida marinha vão transformando o cenário, criando algo novo e fascinante.”
Com tantos segredos ainda a serem descobertos, o naufrágio do Santíssimo Sacramento continua sendo uma das joias submersas mais importantes do Brasil, atraindo mergulhadores e estudiosos de todo o mundo. “Salvador é um dos melhores lugares para mergulhos em naufrágios, e o Sacramento é uma peça central dessa rica história submersa”, conclui Robson, reforçando o valor histórico e turístico da Baía de Todos-os-Santos.