Belov: a lenda viva da navegação brasileira rompe o gelo da Sibéria aos 82 anos

Em plena temporada de verão polar, o navegador Aleixo Belov, de 82 anos, alcançou o porto de Dikson, no extremo norte da Rússia, a bordo do Veleiro Escola Fraternidade. A chegada marca a primeira etapa concluída da Expedição Passagem Nordeste 2025 — uma das rotas marítimas mais desafiadoras do planeta, localizada no Ártico russo. Belov, que tem origem ucraniana e construiu sua carreira no Brasil, reforça com esse feito sua posição como um dos maiores nomes da navegação brasileira em atividade.

🔵 Um marco brasileiro no Círculo Polar Ártico

Zarpando de Salvador no dia 12 de abril, Belov deixou a Base Naval do 2º Distrito da Marinha do Brasil com o apoio institucional do Navio‑Veleiro Cisne Branco, numa cerimônia simbólica que já sinalizava a importância dessa viagem: não era só mais uma expedição, mas um tributo à sua própria história.

O destino: Rota do Mar do Norte, também conhecida como Passagem Nordeste, que liga o Atlântico ao Pacífico contornando a Sibéria por cima, numa janela curtíssima do verão em que o gelo recua parcialmente. Essa travessia é considerada uma das mais difíceis do mundo — mais complexa até que o Cabo Horn ou os Mares do Sul, segundo especialistas.

O que se via como algo inatingível para um navegador solitário tornou-se realidade por meio de uma tripulação internacional e enxuta, que inclui russos, brasileiros e o comandante polar Sergei Shcherbakov, especialista em gelo e navegação extrema. Juntos, partiram de Murmansk, no norte da Rússia, em direção a Dikson — o primeiro de quatro portos estratégicos do trajeto.


🧭 GPS quebrado, bússola fora do eixo e navegação à moda antiga

Mas a travessia não foi tranquila. Pelo contrário.

Logo nos primeiros trechos, o sistema GPS falhou, o piloto automático parou de funcionar e até a bússola apresentou interferências magnéticas — reflexo da proximidade com o Polo Norte e do ambiente eletrônico instável das regiões polares. Foi aí que a experiência de Belov falou mais alto.

Com mais de quatro décadas de mar, ele recorreu a um método quase esquecido entre os navegadores modernos: a navegação estimada, que usa cálculos manuais baseados em tempo, velocidade, vento e direção. A bordo do Fraternidade, o navegador mostrou que a tecnologia pode falhar — mas a técnica, não.

Esse episódio, mais do que uma curiosidade técnica, revela uma questão maior: a fragilidade humana diante da natureza e a resiliência de quem confia no saber acumulado. Poucos navegadores no mundo — em qualquer idade — teriam completado essa travessia com tamanha maestria.


🔺 Geopolítica, emoção e adaptação: a rota em constante mutação

Enquanto enfrentava os desafios climáticos, Belov também lidava com o agravamento da tensão internacional envolvendo a Rússia, o que afetou a liberação de rotas e portos. Em Murmansk, ele permaneceu por quase um mês aguardando autorização para prosseguir. Foi ali que reviver memórias soviéticas o emocionou profundamente.

Com a chegada a Dikson, ele agora avalia se seguirá ou não até o Oceano Pacífico, como previa o plano original. A decisão dependerá da abertura do gelo nos próximos dias — uma janela que costuma durar no máximo 4 a 6 semanas. Caso os riscos aumentem, alternativas como recuar pela Islândia, Ilhas Faroe ou Noruega estão sobre a mesa.

A travessia deixou de ser apenas física: ela se tornou simbólica, quase filosófica. Um homem, um barco e um passado — navegando juntos por entre as brechas do futuro.


🌍 O legado de Belov e o papel de Salvador no cenário náutico internacional

Belov não representa só um navegador de exceção. Ele é também um embaixador silencioso da Baía de Todos-os-Santos e da cultura náutica de Salvador, que se consolida como um dos centros de excelência em formação, construção naval e eventos de grande porte, como a regata Transat Jacques Vabre.

Fraternidade, aliás, foi construído na capital baiana, com técnicas tradicionais e refinadas. Hoje, ao cruzar mares congelados, o barco leva consigo não só uma bandeira — mas um modo de vida.


✨ Um futuro ainda em aberto

Aos 82 anos, Aleixo Belov ainda escreve sua história com coragem, rigor e espírito inquieto. A chegada a Dikson não é o fim — é apenas mais uma página de um diário marítimo que se recusa a ser encerrado.

Total
0
Shares
<<
Simulado na Praia do Porto da Barra chama atenção para prevenção de afogamentos

Simulado na Praia do Porto da Barra chama atenção para prevenção de afogamentos

>>
Tonelada de água-viva exótica é removida em Itaparica

Tonelada de água-viva exótica é removida em Itaparica

O papo continua
Total
0
Share